Milton Friedman, o economista americano e vencedor do prémio nobel da economia em 1976, defendia que o principal objetivo de uma empresa é a maximização do lucro para os sócios ou acionistas.

Durante décadas foi este o princípio em que assentou o planeamento da maioria das empresas. Foram então desenvolvidas estratégias com modelos de negócio que maximizavam o retorno para os acionistas, o Total Shareholder Return* (TSR).

Total Shareholder Return – ou retorno total para o acionista (ou sócio), representa o rendimento total que um sócio ou acionista obtém pela posse das quotas ou ações de determinada empresa.

Hoje em dia os stakeholders (pessoas ou entidades com interesses numa empresa) são mais alargados e de origem interna ou externa. Estes stakeholders têm vindo a aumentar progressivamente a exigência para com as atividades das empresas, aumentando a pressão sobre as mesmas.

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O interesse por parte de investidores por negócios com práticas social e ambientalmente responsáveis tem também vindo a aumentar em virtude do reconhecimento que bons desempenhos nessas áreas têm impacto nos resultados das empresas a longo prazo.

Os governos como stakeholders esperam que as empresas se empenhem em contribuir de forma positiva para a sociedade para resolver problemas económicos e sociais e estão dispostos para desenvolver parcerias ou dar algum tipo de apoio.

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas pretendem resolver os desafios globais relativamente à pobreza, desigualdades, clima, degradação ambiental, paz e justiça e estabelecem um conjunto de metas para 2030. Estes objetivos só serão atingidos com o envolvimento de toda a sociedade, incluindo as empresas do setor privado.

A emergência de conceitos como a Indústria 4.0 e a Big Data, Fintech, a Economia Circular e a Inteligência artificial, demonstram esta preocupação constante com o desenvolvimento de atividades sustentáveis, com cadeias de valor mais curtas e com maior informação disponível a todos os intervenientes. O consumidor é hoje em dia mais informado sobre os produtos que consome e insere nas suas opções de consumo as variáveis com impacto na sociedade (responsabilidade social, legal, ambiental, etc.).

O Boston Consulting Group (BCG) desenvolveu um estudo aprofundado em cinco diferentes setores em que analisa o impacto das variáveis ambientais, sociais e de governance na performance das empresas e a forma como estas estão a integrar objetivos societais (com impacto na sociedade) nas suas estratégias, o Total Societal Impact.

O que é o Total Societal Impact (TSI)?

O desenvolvimento do negócio de cada empresa tem um impacto económico, social e ambiental na sociedade. Este impacto pode ser de ordem negativa ou positiva e é representado pelo TSI. O TSI é então um conjunto de indicadores, dados e avaliações que as empresas deverão utilizar na altura de definir a sua estratégia.

Exemplos:

  • O benefício social de determinado produto ou serviço (um medicamento que salva vidas, um seguro automóvel que protege o proprietário em caso de acidente);
  • Práticas empresariais que definam princípios éticos de negócio ou práticas de recrutamento inclusivas que afetem a comunidade;
  • A criação de emprego direta e indireta associada ao estabelecimento de uma empresa em determinada localização;
  • Impacto ambiental, seja negativo (como as emissões gasosas) ou positivo (como os novos produtos ou processos inovadores que reduzem a poluição).

As atividades de uma empresa têm impacto na sociedade e determinam a criação de valor para os sócios ou acionistas. Mas estas duas perspetiva não são opostas!

O Boston Consulting Group encontrou, no mesmo estudo, evidências de ligações diretas entre a forma como as empresas gerem o seu negócio, com práticas responsáveis e com TSI positivo, que maximizam ao mesmo tempo o valor para os acionistas.

Os resultados obtidos revelaram que já não é suficiente para uma empresa pensar no impacto das suas atividades de forma desagregada ou como atividade acessória e de resolução de problemas. O impacto societal não pode ser separado do negócio principal da empresa.

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Fonte: BCG

Hoje em dia é essencial para que as empresas utilizem o seu core business (e as vantagens de escala que este oferece) para gerar impacto societal positivo ao mesmo tempo que procura maximizar os seus resultados.

A lente TSI (Total Social Impact Lens) defende a integração do impacto social na estratégia, potenciando oportunidades e alargando a cadeia de valor da empresa. Este foco no TSI vai permitir construir modelos de negócio com atividades mais responsáveis, com crescimento sustentável, reduzindo o risco de eventos negativos e resultando numa maior longevidade das empresas.

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Fonte: BCG

O gráfico anterior representa as atividades com impacto para os acionais ou sócios (TSR) e para a sociedade (TSI):

  • Atividades de elevado risco ou que resultam em acidentes ou comportamentos menos éticos têm um impacto negativo na sociedade e no valor da empresa;
  • A filantropia tem impacto na sociedade, mas com resultado nulo (ou marginal) para as empresas ou marcas;
  • Externalizando más práticas ambientais e sociais (despejo de afluentes num rio por exemplo) pode gerar resultados positivos para a empresa no curto prazo ou resolver um problema. No entanto o impacto social é negativo e no longo prazo não é uma atividade sustentável ou geradora de valor;
  • Criar um produto ou serviço com valor intrínseco para a sociedade (que resolva um problema ou responda a uma necessidade) tem impacto societal positivo e gera retorno para os acionistas ou sócios;
  • A utilização do core business, devidamente alinhada com o TSI, permite gerar resultados no curto prazo e contribuiu de forma positiva para a sociedade, criando valor no longo prazo para a empresa.

Como identificar as atividades com impacto positivo no TSR e no TSI?

Estas atividades representam oportunidades de negócio que geram um elevado retorno para os sócios ou acionistas, ao mesmo tempo que respondem a uma necessidade social e variam de setor para setor.

É necessário identificar claramente como cada empresa pode utilizar o seu negócio para responder aos desafios e aos objetivos da sociedade, alavancando as suas capacidades.

De acordo com o BCG isto poderá ser feito de três formas:

  • Alterando a cadeia de valor (transportes mais limpos, encurtamento da cadeia de distribuição, proximidade com matéria prima, etc.);
  • Alavancando as capacidades atuais do core business da empresa (focando nas atividades prioritárias de criação de valor para a empresa e para a sociedade e procurando criar escala);
  • Melhorando ou desenvolvendo novos produtos ou serviços.

Foco no TSI – Oportunidades

O BCG concluiu que as empresas que têm vindo a ajustar o seu modelo de negócio, procurando melhor o seu TSI têm obtido vantagens significativas. Esta redefinição permitiu-lhes dedicar uma atenção especial a atividades que não eram prioritárias, mas que têm impacto na capacidade das empresas sobreviveram a longo prazo, evitando uma destruição de valor.

Ao mesmo tempo estas empresas conseguir detetar novas oportunidades internas e externas:

  • Abertura de novos mercados – Uma estratégia preocupada com o impacto social pode dar acesso a novos mercados, localizações ou segmentos. Esta abertura pode ser potenciada, por exemplo, através de parcerias com outras empresas ou entidades não-governamentais. Mesmo que estes mercados não se revelem de elevado rendimento no curto prazo, poderão ter um impacto significativo no crescimento de longo prazo;
  • Incentivo à inovação – Inserir as preocupações sociais no desenvolvimento dos seus produtos ou serviços contribui em muitos casos para incorporar características inovadoras que respondem a uma necessidade da sociedade;
  • Redução de risco na distribuição – O desenvolvimento de cadeias de valor mais curtas, sustentáveis e inclusivas reduz a dependência dos grandes distribuidores, tornando-as mais independentes e reduzindo os custos;
  • Aumento da notoriedade – Empresas com práticas ambientais e sociais reconhecidas veem os seus produtos valorizados pelo cliente, aumentando a confiança e lealdade. Este aumento da notoriedade pode representar maior volume de vendas ou até a prática de preços premium para determinados segmentos de mercado;
  • Vantagens na atração e retenção de talentos – Uma empresa com um contributo positivo para a sociedade, reconhece um alinhamento e envolvimento extra dos seus colaboradores, garantindo-lhe vantagens competitivas nos processos de atração, desenvolvimento e retenção de talentos;
  • Contributo para o tecido económico e social – Empresas com contributo significativo para o desenvolvimento económico e social de um país são reconhecidas pelas entidades nacionais e locais, gerando relações mais próximas com os governos, reguladores, etc.

O BCG detetou que existe uma relação positiva entre uma gestão com preocupações sociais e ambientes e as margens de negócio. A consultora concluiu que as empresas que conseguem aproveitar estas oportunidades, focando-se no desenvolvimento sustentável, aumentam a probabilidade de crescimento e sobrevivência no longo prazo.

As empresas maximizam a sua capacidade de sobrevivência ao identificar e monitorizar o TSI no futuro, combinando a gestão diária das operações com uma visão estratégica sustentável de longo prazo que maximize o impacto positivo na sociedade, ao mesmo tempo que aumenta o lucro para os acionistas. O principal objetivo de uma empresa de acordo com Milton Friedman permanece válido e a responsabilidade social pode contribuir de forma positiva para a criação de valor no longo prazo.

Está pronto para incorporar os desafios societais na sua estratégia?

 

Este artigo foi baseado em:

“Total Social Impact – A New Lens For Strategy”, The Boston Consulting Group, October 2017