Se queremos estar preparados para o futuro é fundamental elaborar possíveis cenários que reflitam as incertezas e, apesar da mudança constante que vivemos, podemos observar megatendências que funcionam como indicadores de possíveis futuros.
As megatendências são processos de longo prazo que já são observáveis no presente e que têm uma elevada probabilidade de influenciar significativamente o futuro. O futuro constrói-se hoje, mas não sem compreender bem as megatendências para perceber quais os futuros possíveis.
O Megatrends Watch Institute identificou as 10 megatendências para 2050 que se apresentam na figura seguinte:
Nos resultados do Global CEO Survey que a PWC apresentou no início deste ano, 45% dos CEO acredita que a sua empresa deixará de ser viável no espaço de 10 anos se continuar o mesmo caminho. O mais interessante é que esta preocupação não tem a ver com questões económicas, mas com a necessidade de reinventarem os modelos de negócio face às megatendências identificadas e, em particular, as Alterações climáticas logo seguida da Inteligência artificial e da disrupção tecnológica que a acompanha.
E que impacto é que estas megatendências terão em Portugal?
A RePLAN – Rede de Serviços de Planeamento e Prospetiva da Administração Pública divulgou recentemente um estudo com os impactos para Portugal de 9 megatendências relacionadas com as anteriores e deixo-vos aqui alguns aspetos apresentados neste estudo e que considero cruciais para o desenvolvimento do mundo empresarial:
- Agravamento das alterações climáticas:
Portugal está particularmente vulnerável a fenómenos extremos decorrentes das alterações climáticas. A diferença entre a temperatura média do ar em 2019 e em 1971 já é de 1,5 ºC e até 2050 antecipam-se aumentos de temperatura iguais ou superiores a 2 ⁰C e uma redução da precipitação média anual de 20% a 40%.
Estas alterações vão afetar não só a qualidade de vida, mas também a sustentabilidade do desenvolvimento e Portugal não ficará imune às migrações e deslocação de populações devido aos efeitos das alterações climáticas. A climatização dos espaços urbanos será um desafio, bem como a prevenção e controlo de incêndios rurais e de inundações. A escassez de água irá afetar todos os cidadãos e atividades, muito em especial a produção agrícola, e teremos um aumento da insegurança alimentar bem como um agravamento de condições crónicas de saúde.
- Pressão crescente sobre os recursos naturais:
A capacidade de autoaprovisionamento alimentar de Portugal e da UE poderá diminuir com o agravamento das alterações climáticas e a desertificação provocando uma maior volatilidade dos preços dos bens alimentares. A escassez hídrica devida a períodos de seca e a gestão desequilibrada deste recurso levará a um maior conflito pelo uso da água entre as utilizações humana, energética e agrícola, com uma pressão acrescida para a adaptação da agricultura a um contexto mais adverso.
Portugal possui alguns depósitos minerais importantes, mas manterá uma forte dependência face ao exterior para a generalidade das matérias-primas, incluindo os combustíveis fósseis, o que poderá ser colmatado por uma transição mais expressiva para a economia circular como forma de aliviar a procura de matérias-primas.
Os recursos marinhos, para além das pescas, apresentam potencialidades para ter um papel cada vez mais importante na economia portuguesa (por exemplo, destaca-se o elevado potencial das algas no aliviar das pressões ambientais de abordagens convencionais na agricultura, aquicultura e pescas).
- Diversificação e mudança dos modelos económicos
Face à crescente volatilidade da oferta e dos preços de matérias-primas críticas e componentes críticas de produtos nos mercados internacionais, poderá existir um maior protecionismo económico e uma maior intensidade no uso dos recursos endógenos em Portugal (por exemplo: energias renováveis e recursos minerais), conduzindo a um aumento das oportunidades para a adoção de modelos de negócios inovadores e mais circulares onde os fundos comunitários poderão ter um importante papel.
- Evoluções demográficas divergentes
Portugal é o segundo país mais envelhecido da UE, tendo em 2022 registado 185,6 idosos por cada 100 jovens. Estima-se que em 2050 o índice de envelhecimento subirá para 297,2 idosos por cada 100 jovens e que a proporção de pessoas idosas no total da população será de 32%.
Esta tendência irá provocar uma recomposição da procura de bens e serviços (por exemplo: geriatria) e uma crescente importância dos investimentos na terapêutica, na biotecnologia e na medicina de precisão. Por outro lado, é um enorme desafio ao crescimento do PIB (devido ao aumento da população inativa e da diminuição da população ativa).
Contrariando a tendência de decréscimo populacional verificada na década passada e que este cenário antecipa, a população residente em Portugal tem vindo a aumentar desde 2019 por via da imigração. No entanto o interior do país tem vindo a assistir a um despovoamento cada vez mais acentuado e com tendência de agravamento.
Uma população mais diversa étnica e culturalmente, traz potenciais assimetrias territoriais e crescentes desafios de integração, bem como o crescimento de tensões racistas e xenófobas, mas também novos trabalhadores e competências para o país.
O mercado de trabalho vai decisivamente alterar, quer pela via do envelhecimento da população, quer pelo aumento dos movimentos migratórios.
- Um mundo mais urbano
A acentuação das assimetrias territoriais (despovoamento do interior e litoralização) agrava a pressão sobre a habitação (inadequação quantitativa, funcional e energética do parque habitacional), sobre as infraestruturas físicas e digitais (que estão subdimensionadas) e sobre a modernização e expansão das redes de transporte e outras infraestruturas de interesse geral como águas, energia, saneamento e comunicações.
Há ainda uma crescente necessidade de adaptar as cidades às alterações climáticas, à subida do nível do mar e a fenómenos climáticos extremos (como cheias e ondas de calor).
- Um mundo mais digital
Portugal acompanha, em termos gerais, todas as tendências registadas no desenvolvimento da economia e sociedade digitais. Em 2021, 96% dos lares portugueses tinham acesso à internet de banda larga. Portugal é um dos países com maior introdução de internet móvel, com uma taxa de utilização de 92% da população. A hiperconectividade no País tem tido um impacto significativo em várias áreas da sociedade, nomeadamente na educação, nos sectores público e privado e no entretenimento.
O investimento em IA e Realidade Aumentada/Realidade Virtual (AR/VR) irá aumentar 24,3% e 56,6%, respetivamente, até 2025 e a área de blockchain aumentará 34,6%, até à mesma data o que provocará um aumento da eficiência e da produtividade (crescimento económico, novos produtos, serviços, modelos de negócios e padrões de vida e de trabalho) com impacto transversal aos sectores de atividade (robótica, comunicações, medicina, transportes e logística, indústria, serviços, agricultura, sistema financeiro e comércio).
O país apresenta um grande potencial para se tornar um líder em áreas como a IA, a cibersegurança, as energias renováveis e a mobilidade sustentável e a sua localização geográfica estratégica é e será um importante ponto de interesse para o mercado de dados (conexão da Europa às Américas e a África, através de cabos submarinos relevantes).
No entanto, também existem desafios.
Haverá um aumento do potencial nocivo e da frequência de ciberataques, bem como um aumento da magnitude de campanhas de desinformação, com crescente dificuldade em distinguir entre a realidade e as fabricações e/ou manipulações, reforçando a relevância da literacia digital para mitigar esta tendência e a crescente importância de competências digitais e comportamentais (componente importante da cibersegurança).
Também por esta via se irão observar alterações profundas ao mercado de trabalho com obsolescência de certas funções e emergência de novas profissões.
Com a digitalização vem também o aumento do consumo de energia associado às necessidades de processamento, armazenamento e conectividade digital, muitas vezes esquecido.
- Aceleração do desenvolvimento tecnológico
Nas últimas décadas o sistema científico e tecnológico português cresceu e fortaleceu-se em termos institucionais, de recursos humanos e na abrangência das áreas disciplinares e das redes internacionais que integra e perspetiva-se que Portugal continue a ter uma importante capacidade formativa nas áreas CTEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática).
Regista-se também uma tendência para o aumento da participação das empresas no esforço de financiamento e na atividade científica nacional, gerando mais registo patentes pelas universidades, o surgimento de mais spin offs universitários e a consolidação do empreendedorismo de base tecnológica.
Dada a extensa zona costeira de Portugal e o seu pioneirismo nesta área, há também um potencial desenvolvimento da biotecnologia azul e das energias renováveis de origem ou localização oceânica.
Poderão assim surgir novas fileiras industriais associadas às tecnologias emergentes, com maior eficiência e produtividade, com menores impactos ambientais dos processos de fabrico e das cadeias de abastecimento devido à menor produção de resíduos. Esta tendência poderá contrariar a emigração de pessoas qualificadas gerada pela crescente procura por recursos humanos formados nas áreas CTEM a nível internacional.
Esta realidade também conduz a uma crescente necessidade de regulamentação e de regulação relacionadas com o desenvolvimento e a utilização das tecnologias em resposta à preocupação com as questões éticas, que serão particularmente pertinentes nos domínios da bioengenharia e da IA.
- Um mundo multipolar
Portugal está política, económica, militar e diplomaticamente integrado nos blocos UE e NATO, sendo decisiva a evolução futura desses blocos. A eventual expansão da UE para leste significará maiores tensões internas e internacionais, uma diminuição do peso relativo dos países, o alargamento dos mercados e da concorrência, bem como uma redistribuição dos fundos.
A localização atlântica (que pode permitir a inserção nos roteiros internacionais de circulação de mercadorias e de dados), a posição na CPLP e as relações históricas com países como Brasil, China ou Índia poderão reforçar a capacidade de Portugal moldar as decisões no seio dos blocos onde está integrado e melhor ajustar-se às suas evoluções futuras.
- Novos desafios à democracia
A par do crescimento da polarização política haverá uma crescente preocupação dos cidadãos face à persistência das desigualdades e recuo, real ou percecionado, das suas condições de vida.
As redes sociais, detidas por grandes empresas multinacionais que Portugal não controla, terão um papel cada vez mais relevante em novas formas de ativismo político e social (fora dos partidos, organizações e movimentos sociais tradicionais), mas também na disseminação de notícias falsas e de mensagens de ódio, que poderão ter um papel importante da definição do debate político.
A estabilidade governativa poderá diminuir e até tornar-se precária, devido a uma menor capacidade de estabelecer consensos ou gerar maiorias políticas (tal como já estamos a observar) e poderá haver um aumento da influência de atores não estatais nas decisões públicas.
Portugal poderá ainda confrontar-se com um ambiente institucional europeu de conflito ou paralisia, em que grupos de Estados-Membros poderão pôr em causa elementos definidores do Estado de direito e atrasar significativamente decisões relevantes, como a distribuição de fundos.
Estas são algumas notas da introdução do estudo que a RePLAN está a desenvolver e que agora apresentou. O estudo final só será apresentado no final do ano, mas a mudança necessária nas nossas organizações pode e deve iniciar já. Estas são as megatendências identificadas para 2050, mas a realidade é que são processos que já hoje se fazem sentir.
Analise o seu negócio à luz destas megatendências e reinvente o seu modelo de negócio para iniciar hoje a construção da empresa que quer ter no futuro. Nós estamos aqui para o ajudar.