Todos os dias ouvimos falar do novo normal para designar o contexto atual ou mesmo o pós-pandemia. Na realidade, há vários anos que é frequente referirmos que vivemos em tempos de incerteza e grande mudança. No entanto parece que essa mudança é cada vez mais acentuada e rápida.
No final de 2019 falei aqui do mundo VUCA – Volatile, Uncertain, Complex e Ambiguous. Atualmente parece-me mais adequado o termo mundo TUNA para contextualizar a realidade atual. Mas o que é o mundo TUNA (ou TINA, em português)? É o nosso mundo atual: Turbulento, Incerto, Novo e Ambíguo.
E como podemos enfrentar o mundo TINA?
É importante ter Visão, Compreensão (Understanding), Clareza e Agilidade e a construção de cenários é vital para proporcionar contexto à definição da estratégia a adotar. Mas agora a palavra chave é NOVO e só conseguimos navegar num mundo novo com INOVAÇÃO.
Mas não basta inovar no produto ou serviço que produzimos. É preciso inovar a nossa forma de pensar, é preciso inovar na forma como lideramos a nossa empresa e é preciso inovar no Pensamento Estratégico.
Tal como a diversidade é um dos princípios fundamentais para tornar uma empresa mais resiliente a choques como o que vivemos, também é fundamental para inovar. Tal como a resiliência depende da capacidade de gerar caminhos alternativos para reagir às situações (que por sua vez depende da capacidade de olhar para as coisas de uma nova forma), também a inovação depende da capacidade de gerar novas ideias e soluções para um dado problema ou desafio e quanto maior for o número de perspetivas diferentes, maior será o número de boas ideias geradas.
Mas contratar pessoas com experiências diversas e com diferentes perfis cognitivos não chega. É fundamental desenvolver um ambiente que acolha múltiplas formas de pensamento e de ação.
Ely e Thomas (1), num artigo que acaba de ser premiado com o 1º lugar nos 2020 HBR McKinsey Awards, salientam que não basta contratar mais colaboradores mulheres e/ou pessoas de diferentes raças e culturas para recolher os benefícios da diversidade. Tal só é possível se os líderes criarem um ambiente de trabalho psicologicamente seguro, acolherem os diferentes estilos e identidades dos seus colaboradores e fizerem das diferenças culturais um recurso para a aprendizagem e melhoria da eficácia organizacional.
Esta não é uma tarefa fácil e as empresas tendem a ficar por modelos que, apesar de apostarem na diversidade na hora da contratação, não alteram o status quo. Para conseguir o desejado paradigma aprendizagem-eficácia, Ely e Thomas identificaram 4 ações:
- Construir confiança: criar um ambiente em que qualquer pessoa se sente segura para se expressar livremente. Isto requer adotar um tom de discurso honesto e ficar confortável com a vulnerabilidade (a sua e a dos outros);
- Trabalhar ativamente contra a discriminação e a subordinação: tomar medidas concretas para combater formas de discriminação e subordinação que iniba a capacidade dos colaboradores se desenvolverem. Os líderes são os mordomos da cultura da organização e o seu comportamento e mindset ressoam através de toda a organização. Por isso, os líderes têm de passar pelas mesmas mudanças no seu coração, na sua mente e no seu comportamento que pretendem para a organização como um todo e depois traduzir essas mudanças pessoais em mudanças reais e duradoras nas suas empresas;
- Acolher um vasto leque de estilos e vozes: compreender como é que as normas organizacionais podem estar implicitamente a desencorajar alguns estilos comportamentais ou a silenciar algumas vozes, tendo atenção à desmistificação de estereótipos. Muitas vezes feedback bem-intencionado, mas influenciado por estereótipos, acaba por fazer com que os colaboradores fiquem demasiado alerta sobre a perceção que os outros podem ter deles pelo seu “grupo de identidade”;
- Fazer das diferenças culturais um recurso para a aprendizagem: encorajar discussões abertas sobre como é que pertencer a um dado “grupo de identidade” molda a experiência dos colaboradores dentro e fora da organização e daí retirar aprendizagens para melhorar a forma de trabalho e a cultura da organização. Esta 4ª ação apenas pode ocorrer depois das 3 anteriores serem bem-sucedidas.
A existência de um grande número de diferentes perspetivas faz-nos muitas vezes recear que surjam conflitos. No entanto, como já vimos aqui, o conflito é positivo e muitas vezes incompreendido.
Alfred Sloan, CEO da General Motors dizia “Se estamos todos de acordo com a decisão, então proponho adiar a discussão deste assunto até à nossa próxima reunião para nos dar tempo de desenvolver discordância e talvez ganhar alguma compreensão sobre o que está por detrás da decisão”. O entendimento de Sloan era que se todos estão de acordo, então não estão a compreender o problema e a decisão tomada não é uma decisão realmente boa.
Frequentemente, em caso de conflito, procura-se chegar a um consenso em que cada uma das partes abdica de algo e acabamos por ficar com a opção menos má. Mas esta nunca será uma boa solução e certamente não é assim que conduzimos as nossas equipas para a inovação.
Roger Martin (2) acredita que todos nascemos com mentes opostas, o que nos permite ter duas ideias conflituosas numa tensão construtiva e quase dialética. Martin defende que podemos usar esta tensão para gerar novas ideias superiores.
Este autor criou o Pensamento Integrativo, que definiu como sendo “a capacidade de encarar construtivamente a tensão de ideias opostas e, em vez de escolher uma à custa da outra, gerar uma resolução criativa da tensão sob a forma de uma nova ideia que contém elementos das ideias opostas, mas que é superior a cada uma delas.”
Na figura seguinte apresentam-se os 4 passos da tomada de decisão através do pensamento convencional e através do pensamento integrativo.
Enquanto o pensamento convencional é adequado para desenvolvermos soluções progressivamente melhores (melhoria contínua), quando temos situações novas ou mais complexas precisamos de uma abordagem diferente. Nestas situações o pensamento integrativo conduz-nos a soluções mais inovadoras.
O mundo real não é preto ou branco, são muito mais de 50 os tons de cinzento. Cada um de nós tem a sua perspetiva e com ela constrói a sua realidade. Duas soluções opostas podem estar corretas, depende da perspetiva. Com equipas onde impera a diversidade conseguimos ter mais perspetivas. Com o pensamento integrativo conseguimos construir melhores soluções. Não a partir de compromisso entre as diferentes ideias, mas sim partindo daquilo que cada solução tem de melhor para atingir uma solução superior.
Vão todos ficar satisfeitos? Não, mas se todos estão felizes, então a solução não é fantástica.
(1) Robin J. Ely e David A. Thomas, “Getting Serious About Diversity”, Harvard Business Review, November-December 2020
(2) Roger Martin, “The Opposable Mind: How Successful Leaders Win Through Integrative Thinking”, Harvard Business Review Press, 2008