De acordo com Mintzberg os gestores passam demasiado tempo a analisar gráficos em detrimento do tempo passado a experienciar e sentir a empresa. Em geral, os fatores que levam ao sucesso de um negócio são difíceis de medir, pelo que as análises se centram em fatores facilmente mensuráveis, avaliando a eficiência de processos através da redução de custos sem ter em conta a perca de proveitos não mensuráveis. O conhecimento do mercado e dos clientes, a cultura de inovação que se vai desenvolvendo ou os ganhos sociais obtidos em várias situações, por exemplo, são muitas vezes difíceis de medir e por isso afastados dos instrumentos de informação à gestão. Na opinião de Mintzberg os gestores devem por isso sair dos seus gabinetes, afastar-se dos gráficos e experienciar a realidade.

Claro que a experiência de Mintzberg assenta no contacto com grandes empresas. Já a minha experiência resume-se a PME e observo a situação contrária. Grande parte dos gestores das PME olham pouco para os gráficos. Muitas vezes nem têm dados disponíveis para análise. Ao gabinete vão pouco, passando o dia pela empresa a resolver as mais diversas questões. Aqui experiencia-se a realidade do dia-a-dia.

Só que muitas vezes “a realidade não é o que parece”. Carlo Rovelli acentua esta ideia ao contar-nos a evolução da física no livro que escreveu com este título. Para que o conhecimento avance é necessário que exista visão, é imprescindível que alguém consiga ver para além do quadro de referência atual e que desenhe uma nova “realidade”. Precisamos de um visionário.

É o caso de Faraday, por exemplo, que no século XIX, apesar de não ter qualquer educação formal, intuiu a existência do que hoje designamos por “campo eletromagnético”. Mas foi necessário que um matemático, Maxwell, traduzisse a visão de Faraday em equações para que a comunicação se desenvolvesse como hoje a conhecemos. Rádio, televisão, telefones, computadores, navegação por satélites, wi-fi, internet, etc, são tudo aplicações das equações de Maxwell. Rovelli afirma mesmo que toda a civilização contemporânea, assente na rapidez das comunicações, nasce da intuição de Faraday traduzida pelas equações de Maxwell.

Este aliás foi um dos principais problemas com que se defrontou Einstein no desenvolvimento das suas teorias. Einstein tinha uma visão do universo que muitas vezes não era corroborada pelas equações que desenvolvia. Em alguns casos eram as equações que estavam erradas (Einstein tinha alguma dificuldade com a matemática), noutros casos era a sua intuição que estava errada. Apenas quando uma visão consegue ser traduzida por equações matemáticas e as soluções dessas equações são validadas pela observação experimental estamos perante uma teoria válida e estamos mais perto de conhecer a realidade.

Voltando ao início deste artigo: nas grandes empresas impera a racionalidade e a análise de dados concretos e nas PME impera a intuição. Mas estas duas dimensões são de extraordinária importância para que uma empresa possa evoluir com sustentabilidade e terão de andar sempre de mãos dadas. É vital saber combinar as duas na proporção correta.

Também nas empresas necessitamos do visionário, papel normalmente atribuído à liderança (mas não necessariamente). Tal como fez Faraday é preciso que nas empresas alguém consiga ver para além do quadro de referência atual e que desenhe uma nova “realidade”. Principalmente em épocas mais desafiantes, como a que vivemos atualmente.

Mas também precisamos de um Maxwell, alguém que consiga traduzir essa visão em objetivos mensuráveis e indicadores adequados, mesmo quando se tratam de dimensões desafiantes. Ou seja, precisamos de uma equipa de gestão que, apesar de constituída por pessoas com competências bem diferentes (mas complementares), seja capaz de partilhar as suas ideias e trabalhar em conjunto para se completarem mutuamente.

Para o líder fica o desafio de ser capaz de se rodear de seguidores eficazes e apoiar o seu desenvolvimento.

“Leadership is not about being the center of attention, it’s about being the epicenter of action.”

Richard E. Peck, Toastmasters’ 2020-2021 International President

 

Henry Mintzberg, “Histórias de embalar para gestores”, Ed. Gestão Plus, 2020.

Carlo Rovelli, “A realidade não é o que parece”, Ed. Contraponto, 2019.