A obtenção de crédito bancário é um dos principais desafios para as empresas, particularmente as PME, sendo um dos fatores que trava o aumento do investimento. No entanto, a maioria das PME recorre ao crédito bancário para suportar os seus planos estratégicos e alavancar o seu crescimento.

A crise económica levou a um aumento do crédito malparado. Apesar da inversão de tendência que se tem vindo a verificar, em setembro deste ano cerca de 20,6% das empresas tinham empréstimos em incumprimento segundo dados do Banco de Portugal. Esta conjuntura, juntamente com as dificuldades que o sistema financeiro tem atravessado, levaram os bancos a acautelarem as suas operações, restringindo a concessão de crédito e conduzindo a uma maior dificuldade das empresas em se financiarem.

Neste contexto, conhecer as alternativas de financiamento, algumas já abordadas aqui, é de importância extrema para as empresas. Numa altura em que os empréstimos bancários estão restringidos, as alternativas ao financiamento bancário, como a emissão de obrigações, são cada vez mais uma oportunidade a considerar no financiamento das PME.

As obrigações são títulos de dívida que representam um empréstimo contraído junto dos investidores pela entidade que as emite, que tanto podem ser empresas, como o Estado ou outras entidades públicas ou privadas. Ao adquirir uma obrigação o investidor torna-se credor dessa entidade. Em setembro deste ano as obrigações totalizavam na Euronext Lisbon (a principal praça portuguesa) cerca de 183 mil milhões de euros de capitalização.

O recurso a estes instrumentos é uma tendência crescente. De facto, tem-se assistido nos últimos anos a uma diminuição do peso dos empréstimos bancários e a um crescimento de fontes alternativas de financiamento como a emissão de títulos de dívida (nomeadamente obrigações e papel comercial).

Estas formas de financiamento alternativas, apesar do seu peso ainda reduzido, foram as que mais cresceram nos últimos anos, contrapondo a diminuição do peso dos empréstimos bancários. Em 5 anos mais que duplicaram o seu peso na composição do financiamento das PME para cerca de 5% dos financiamentos obtidos, segundo dados do Banco de Portugal.

 

Composição dos financiamentos obtidos nas PME

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Fonte: Quadros do Setor – Banco de Portugal

 

Existem vários tipos de obrigações. Entre as mais comuns destacam-se:

  • As de taxa fixa (definida no momento de emissão do título);
  • As de taxa indexada (definida como um spread face a uma taxa de juro de referência, como a Euribor – indexante);
  • As de cupão zero (não existem cupões periódicos sendo a obrigação emitida abaixo do par, ou seja, com um preço inferior a 100 por cento, sendo que a rendibilidade dos investidores decorre da diferença entre o valor da emissão e o valor nominal).

Qualquer empresa pode emitir obrigações desde que cumpra determinados requisitos. Salvo exceções previstas na lei, podem emitir obrigações as sociedades cujo contrato esteja definitivamente registado há mais de 1 ano. Cumulativamente, as sociedades só poderão emitir obrigações desde que, após a emissão, apresentem um rácio de autonomia financeira (Capital próprio/Ativo) igual ou superior a 35%, calculado a partir do balanço da sociedade.

O cumprimento do limite de emissão deve ser verificado através de parecer do conselho fiscal, do fiscal único ou do revisor oficial de contas e o prazo de emissão poderá ser fixado sem qualquer limitação (geralmente, varia entre 3 e 10 anos).

A legislação principal que enquadra as emissões de obrigações é o Código das Sociedades Comerciais, nomeadamente Artigo 348º e seguintes, e o Código dos Valores Mobiliários.

Além das emissões de obrigações, também as emissões de “papel comercial” são cada vez mais acessíveis às PME.

O “papel comercial” são títulos de crédito de curto prazo (inferior a um ano) emitidos por sociedades comerciais ou civis sob a forma comercial, cooperativas, empresas públicas e pessoas coletivas de direito público ou privado. Esta forma de financiamento permite obter fundos a curto prazo junto de um leque potencialmente alargado de investidores finais.

A revisão do regime jurídico do papel comercial (Decreto-Lei n.º 29/2014, de 25 de Fevereiro) criou condições para potenciar o recurso a este instrumento de financiamento por um número cada vez maior de empresas, em particular as PME.

O diploma alterou os requisitos das emissões de papel comercial, tornando mais flexíveis as emissões dirigidas a investidores institucionais, sem prejudicar os requisitos de segurança e transparência aplicáveis às emissões que se destinem a investidores não qualificados (investidores com menos conhecimentos e experiência nos mercados de capitais).

Passou a ser possível emitir papel comercial com valor unitário inferior a 50 mil euros, sem limites à obtenção de fundos e independentemente do nível de capitais próprios, quando a estrutura de capitais do emitente (empresa) permita assegurar, depois da emissão, um rácio de autonomia financeira considerado adequado, nos termos definidos pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).

Além disso o diploma criou a figura do “patrocinador da emissão” (geralmente uma instituição financeira) que além do compromisso de retenção de uma parte da emissão, tem como principais funções a criação de mercado e a assistência no cumprimento dos deveres de informação por parte da entidade emitente.

Conhecendo as várias modalidades de obrigações e papel comercial, importa perceber quais as principais vantagens que apresentam face a outras alternativas de financiamento:

  • Não implicam acréscimo da dívida bancária ou esforço por parte dos sócios ou acionistas para aumentarem o capital social da empresa;
  • Não existem restrições ao montante de investimento a pedir, exceto o cumprimento da autonomia financeira (ao invés do financiamento bancário, que está limitado aos limites impostos pelos bancos);
  • Permitem o acesso a financiamento sem as garantias exigidas por outras fontes (as empresas não necessitam de deter ativos que sirvam de garante que geralmente são exigidos pelos bancos no pedido de financiamento);
  • São meios de financiamento que proporcionam uma maior flexibilidade da estrutura de capitais da empresa, uma vez que o empréstimo pode ser reembolsado a qualquer momento ou substituído por outro com melhores condições;
  • Possibilitam a dispersão da emissão por múltiplos investidores que tem o efeito de diminuir o risco da operação para os investidores;
  • Dependendo das condições, os custos associados à emissão de dívida no mercado de capitais podem ser inferiores aos juros do financiamento bancário, sobretudo no caso de valores de financiamento mais elevados;
  • Após obtido o financiamento a empresa poderá ter um acompanhamento por parte de analistas financeiros, nomeadamente notações de risco de crédito, aumentando a sua notoriedade no mercado e possibilitando a obtenção de condições mais vantajosas no futuro.

Estas formas de financiamento estão a captar a atenção do Governo que está a desenvolver sistemas de apoio para as promover.

Em junho deste ano, o Governo lançou candidaturas para um empréstimo obrigacionista com financiamento máximo de 15 milhões de euros por empresa, destinado a PME e ‘midcaps’ (empresas até 3.000 trabalhadores) do setor do turismo, sendo a primeira vez que foi lançado um empréstimo obrigacionista deste género a um conjunto alargado de PME em Portugal. A procura do mercado por este empréstimo atingiu os 420 milhões de euros, um valor quatro vezes acima do inicialmente esperado, de 100 milhões de euros.

Esta operação, dinamizada pela Sociedade Portuguesa de Garantia Mútua e pelo Turismo de Portugal, foi avaliada por uma agência de rating internacional, contando com uma garantia pública através do Fundo de Contragarantia Mútuo, que cobriu o risco de cerca de 30% da operação.

No futuro está a ser estudada a expansão destas operações, nomeadamente para a área industrial, o que poderá ser uma oportunidade para as PME deste setor.

O leque de possibilidades de financiamento às empresas nunca foi tão alargado. Na hora de tomar decisões existem cada vez mais opções para obter financiamento, além dos bancos. No entanto, antes de tudo, é necessário ter um plano estratégico sólido e bem estruturado, onde estejam identificadas as condições internas (forças e fraquezas) e as condições externas (oportunidades e ameaças) que poderão ter impacto na empresa.

É também importante ter um plano financeiro bem definido que permita uma tomada de decisão consciente, responsável e adequada ao negócio, para a empresa não comprometer a sua capacidade para solver os compromissos, especialmente quando se está a considerar o financiamento no mercado de capitais.

Já considerou estas alternativas de financiamento para sua empresa?