As empresas familiares têm uma enorme importância na nossa economia, estimando-se que representem cerca de 85% dos negócios em todo o mundo e 62% da força de trabalho dos EUA. De acordo com a Associação de Empresas Familiares, estima-se que em Portugal mais de 70% das empresas têm uma estrutura e propriedade familiar, representando 50% do emprego e 65% do PIB.

Se por um lado associamos as empresas familiares a uma frágil sustentabilidade, por outro lado temos exemplos de sucesso que atravessaram décadas e até mesmo séculos, como o produtor de vinhos italiano Marchesi Antinori cuja história já atravessou 26 gerações ao longo de mais de 600 anos. Em Portugal temos, entre outros, o exemplo da Corticeira Amorim que com os seus 150 anos já vai na 4ª geração.

Baron e Lachenauer (1) realçam como principal característica das empresas familiares o facto de a propriedade ser restrita a um número relativamente reduzido de pessoas que estão relacionadas entre si, conferindo-lhes uma forte capacidade de moldar a empresa de acordo com os relacionamentos entre os proprietários. Gera-se assim um mix potente que cria extraordinários altos e baixos no desempenho destas empresas.

Estes autores consideram que as empresas familiares que perduram exercem bem 5 direitos fundamentais:

  • Design: Qual o tipo de propriedade que querem
  • Decisão: Como vão estruturar a governança
  • Valor: Como definem sucesso
  • Informação: O que vão (e o que não vão) comunicar
  • Transferência: Como lidar com a transição para a próxima geração

Hoje vamos destacar a transição para a próxima geração, sendo que esta é uma preocupação que frequentemente nos é transmitida pelos nossos clientes e a razão pela qual nos contratam.

Segundo estes autores é muito importante ter um plano de continuidade bem definido pois este é um assunto que sendo mal delineado pode causar danos, quer no negócio quer na estrutura familiar. O plano de sucessão não deverá ser pensado apenas para a transição de uma geração para a seguinte, mas deverá definir as regras para a sucessão de geração em geração. Deve ser visto como um processo e não um evento.

Este plano deverá contemplar 3 desafios principais:

  • A transferência dos ativos;
  • A sucessão nas funções;
  • O desenvolvimento das competências da próxima geração.

O Barómetro Europeu de Empresas Familiares (2) identificou que em Portugal 27% dos inquiridos pretendem passar apenas a propriedade dos negócios para a próxima geração e 43% pretendem passar também as responsabilidades de gestão. Na figura 1 apresentam-se os resultados deste inquérito a nível europeu.

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Figura 1: Quais as opções de transição que estão a ser consideradas para os negócios de família? | Barómetro Europeu de Empresas Familiares, KPMG Internacional, 2019

Baron e Lachenauer (1) alertam que na transferência dos ativos é importante definir se se pretende manter o mesmo tipo de propriedade (um único proprietário, sociedade restrita a membros familiares que trabalham ativamente na empresa, sociedade aberta a qualquer membro da família, etc.) ou alterar, se a passagem será gradual ou num só momento e qual o mecanismo da passagem que se irá usar para minimizar taxas/impostos.

Nestas decisões é importante ter em conta um conjunto de eventuais dificuldades expectáveis. De acordo com o Barómetro Europeu de Empresas Familiares (2) 37% dos inquiridos (Portugal: 35%) identifica como grande desafio lidar com as consequências emocionais de renunciar à propriedade e 34% (Portugal: 20%) identifica a gestão das implicações fiscais (ver figura 2).

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Figura 2: Quão difícil será considerar a sucessão da propriedade da família? | Barómetro Europeu de Empresas Familiares, KPMG Internacional, 2019

Já quando se pretende passar também as responsabilidades de gestão para a próxima geração os inquiridos dizem que o maior desafio é encontrar a pessoa certa para a função, sendo que 32% dos inquiridos (Portugal: 30%) sentem que é difícil ou extramente difícil identificar um sucessor (ver figura 3), seguido da motivação (29%) e da sua formação (26%) que estão relacionados com o desafio do desenvolvimento das competências da próxima geração identificado por Baron e Lachenauer (1).

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Figura 3: Quão difícil será considerar a transição de gestão e governance de negócios da família? | Barómetro Europeu de Empresas Familiares, KPMG Internacional, 2019

Estes autores alertam que na passagem de funções para a sucessão é importante não só identificar a(s) pessoa(s) certa(s), como delinear um caminho fluído para uma transição que permita ao líder atual afastar-se gradualmente.

Já no desenvolvimento das competências da próxima geração é importante identificar quais as competências que cada um dos novos proprietários necessita, quer esteja a trabalhar ativamente na empresa ou não, como é que os vamos ajudar a identificar quais as funções mais adequadas para si e como vamos criar as oportunidades que lhes permitam aprender a colaborar uns com os outros.

A gestão das empresas familiares não é fácil e a sucessão é um dos seus grandes desafios. Mas as características únicas destas empresas também lhes permitem frequentemente atingir desempenhos acima da média com exemplos admiráveis de longevidade.

Vale a pena investir no desenho da sua gestão e preparar atempadamente a transição para as próximas gerações.

 

(1) Baron, R. Lachenauer, “Build a Family Business That Lasts”, Harvard Business Review, January-February 2021;

(2) KPMG Enterprise e Associação European Family Businesses (EFB), “Barómetro Europeu de Empresas Familiares”, 8ª edição, 2019.