A crise provocada pelo Covid-19, apesar das medidas tomadas em vários países para mitigar o seu impacto, está para durar esperando-se uma segunda vaga no próximo outono e só quando existir uma vacina ou quando se conseguir atingir a imunidade social é que se poderá pensar que este pesadelo acabou.

O impacto deste evento afetará profundamente os negócios. O FMI estima para 2020 uma contração na economia global de 3%. Para Portugal e Espanha estima uma redução do PIB de 8%, para a Alemanha e França a queda será de 7% e para a zona euro de 5%. O FMI espera que a situação se inverta em 2021 e que as economias Portuguesa e Alemã crescerão 5%, a Espanha e França, tal como a zona euro, terão um crescimento de 4%. Espera-se que a China registe um crescimento vigoroso de 9% em 2021. A redução do nível da atividade económica em todo o mundo será profunda, afetando todos os países, ainda que de forma assimétrica, e pensa-se que esta crise será a pior que vivemos nos últimos 80 anos.

A verificar-se este cenário, a recuperação do nível pré-covid acontecerá na melhor das hipóteses em 2022 e no nosso caso a recuperação dependerá da evolução dos nossos mercados de destino, em especial Alemanha, Espanha, França e Reino Unido.

Se considerarmos um cenário alternativo em que a redução do PIB seja maior e a recuperação seja mais lenta a situação será ainda mais complexa. No entanto, nesta nossa análise vamos assumir como mais provável o primeiro cenário, mais favorável.

Esta evolução parece ir de na linha do que defendem os professores Ricardo Reis (da London School of Economics) e Luis Cabral (da Stern University New York). Este último autor sustenta que a recuperação será atrasada por empresas que já não vão abrir e a sua substituição demora algum tempo. Considera ainda que esta crise terá impacto profundo nos negócios e que haverá rutura profunda no business as usual: os modelos de negócio das empresas e respetivas cadeias de abastecimento terão de ser repensadas. Com o arranque, as grandes empresas, que controlam as cadeias de abastecimento e possuem elevado poder de mercado, vão procurar rapidamente recuperar os prejuízos e, por isso, vão reduzir os preços de aquisição, embora privilegiando fornecedores de proximidade.

É neste contexto de incerteza e desafio que as nossas empresas se devem reinventar e transformar, aproveitando as oportunidades que emergem:

  1. Reconhecimento da importância dos sistemas de saúde estarem preparados para responder a situações de emergência. É necessário reforçar o investimento neste setor para reforçar a sua capacidade de resposta à defesa da saúde pública. Esta é a oportunidade para as nossas empresas entrarem no negócio dos Medical Devices e EPIs.
  2. Necessidade de reduzir a dependência da China e a necessidade de ter fornecedores nearshore em múltiplos setores de atividade industrial. Esta situação é especialmente relevante na área da saúde possibilitando a reconversão de alguns negócios. Parece claro que o modelo que emergiu com a liberalização e internacionalização, com dispersão de cadeias de valor em busca do custo mais baixo e com a concentração de produção em países asiáticos e em especial a dependência da China não pode continuar.
  3. Emergência de uma colaboração rápida e eficiente entre a indústria e as instituições do sistema científico. Derrubaram-se barreiras que permitem agora uma comunicação mais fluída e a realização de projetos de interesse comum com vantagens para todos.
  4. Digitalização, com impacto em todas as áreas das empresas, melhorando processos de conceção, produção, marketing, vendas e prestação de serviços, gerando informação e possibilitando análises mais rigorosas e mais eficiência. A incorporação crescente de Robots, da Inteligência Artificial, da Realidade Aumentada e de Big Data permitem novas abordagens e eficiência operacional.
  5. Aumento dos negócios e do trabalho online. O desenvolvimento das plataformas e sua crescente utilização em pouco tempo, permitiu incrementar as vendas online e flexibilizar o trabalho e comunicação intra/interorganizações reduzindo a distância e custos de deslocação.
  6. Fundos de apoio às empresas que possibilitem a redução de custos ou de reforço à tesouraria para responder à pandemia. Falta ainda perceber o valor e impacto dos fundos provenientes da União Europeia e qual o valor que poderá estar à disposição do nosso país e das nossas empresas. Regista-se também o envolvimento das autarquias locais através das CIM, com a participação de instituições de ensino, de associações empresariais e de empresas locais no desenho de programas e medidas de apoio à retoma das atividades económicas da região.
  7. Qualidade da formação nas nossas escolas que lançam no mercado jovens com boa formação. Reconhece-se em especial a qualidade da formação em engenharia e gestão. Estes licenciados e mestres serão importante suporte para a melhoria da competitividade das nossas empresas.
  8. Mudança na atitude face à cooperação entre empresas do mesmo setor e/ou de setores complementares, que emerge como uma necessidade explicitamente reconhecida por uma ampla maioria de gestores e empresários.

Será que as nossas empresas vão aproveitar estas oportunidades?

O ponto de partida para qualquer empresa é reconhecer quais são os fatores ou fator que terão mais impacto no seu negócio. Depois deve focar-se nesse ou nesses fatores e encontrar as respostas internas adequadas, ajustando os seus recursos e capacidades aos novos desafios.

Identificar as alterações nos mercados e na procura é o primeiro passo para se conceberem ofertas que criem valor para os clientes. Depois é necessário ter os recursos e capacidades adaptados aos processos que geram valor para o cliente e que permitem obter resultados.

Para que todos estes processos se integrem harmoniosamente é necessário envolver e encontrar soluções com os nossos colaboradores. Admitir que neste contexto de incerteza se têm que tomar decisões rápidas e que se podem cometer erros, que se identifiquem também com rapidez e se corrijam. Manter as equipas coesas e ligadas, com capacidade de ação e de adaptação rápida é fundamental para a sobrevivência e crescimento do negócio. Afinal as pessoas e o seu conhecimento e capacidade de adaptação são fundamentais para o sucesso e é importante que a empresa reconheça a sua relevância respeitando-as.

Deve-se também estimular o apoio e serviço ao cliente, o cliente deve ser um parceiro de negócios e as suas necessidades e interesses deverão ser tidos em conta pela empresa.

Deve reconhecer-se finalmente também a responsabilidade que a empresa tem para com a sociedade e em particular para com as comunidades em que se insere.

Finalmente queremos destacar o sucesso de empresas e setores nacionais que ao longo do tempo conseguiram encontrar respostas aos desafios enfrentados e que podem servir de inspiração às nossas empresas.

Empresas de diferentes setores como a BA Glass, Simoldes, Logoplaste, Critical Software, Feedzai, Farfetch são excelentes exemplos de empresas nacionais competitivas à escala global e mostram bem a capacidade das empresas e empresários nacionais.

Trajetórias de diferentes setores em Portugal como o têxtil e o calçado mostraram a capacidade de mudança e adaptação às novas realidades. A criação e desenvolvimento do setor de moldes para plástico mostrou a capacidade de absorção e aplicação de conhecimentos avançados de empresários e trabalhadores conseguindo-se adaptar às exigências de mercados e setores muito competitivos.

Para que o sucesso seja sustentável é importante uma gestão responsável e atenta. Este é certamente um dos desafios atuais às nossas empresas.