Correm dos dias agitados, rápidos, frenéticos mesmo. Trabalhamos a velocidades inacreditáveis e conseguimos essa proeza em movimento, por vezes à volta do mundo. A informação chega-nos em avalanche, com mil e uma solicitações em tempo real. Nesse percurso, só queremos chegar ao topo. Tudo parece apontar para nós e nós, por vezes, parecemos estar realmente convencidos que somos o centro do mundo.

Gilles Lipovetsky diz que vivemos na era do hiperindividualismo. Partindo do princípio que concordamos com o filósofo francês: tal constatação é positiva ou negativa? Provavelmente nem uma coisa nem outra. O que importa mesmo é reflectir sobre ela.

O individualismo é positivo. Não há liberdade nem criatividade sem ele. É uma condição importante para o empreendedorismo e para a competitividade positiva que gera riqueza. Os valores que tomamos como nossos nas sociedades ocidentais relacionam-se profundamente com a originalidade do conceito de individualismo, de sociedades compostas de pessoas únicas, com direitos e liberdade em igualdade. Atacar esse pilar fundamental é colocar toda a civilização em causa.

Mas, por outro lado, esse individualismo exacerbado tem gerado também frustração, deceção e infelicidade – efeitos capazes de desarmonias prejudiciais à construção da felicidade pessoal mas também do próprio desenvolvimento geral socioeconómico.

Neste mundo infinito de potenciais possibilidades, somos, desde o berço, ensinados a defender a nossa individualidade, reforçando-a para atingir a suposta felicidade. É-nos dito que temos liberdade e que podemos ser o que quisermos e quem quisermos. Mas depois dificilmente atingimos esse ideal. Infinitas circunstâncias, imponderáveis, limitações difusas ou físicas, de toda a ordem, condicionam-nos. Com a vida a correr chegamos à conclusão que alguns dos nossos sonhos – muitos deles ligados ao consumo – nunca se realizarão. Logo, ficamos frustrados, pois não temos o que culpar em concreto ou uma razão evidente para justificar tudo aquilo que não fizemos ou não atingimos. Entramos num paradoxo. A liberdade e o individualismo são essenciais, mas podem gerar o efeito contrário, especialmente quando associadas ao consumismo desenfreado. Importa pensar nisso, naquilo que valorizamos ou sobrevalorizamos.

Lipovetsky desafia-nos a pensar sobre o nosso tempo e as prisões auto-infligidas invisíveis que nos condicionam. Nesta sociedade supersónica, fazem falta as pausas para pensar e reflectir sobre a razão de vivermos.

A felicidade deveria ser uma prioridade, pois, a partir dai, tudo se simplifica, todos os projectos pessoais e colectivos.

 

Leitura recomendada: LIPOVETSKY, Gilles – A Sociedade da Deceção. Lisboa: Edições 70, 2012.