“Os estudos dizem que a nossa felicidade depende de como nos comparamos com os outros. Assim, em vez de te dar um aumento, vou-te mostrar fotografias de pessoas atacadas por ursos”.
Pointy-haired boss (chefe do Dilbert)
Uma das mais recentes tendências (ou modas) da gestão é a promoção da felicidade nas organizações. O pressuposto é simples: as organizações devem criar condições para que os seus trabalhadores sejam mais felizes no trabalho. Tal pode ser conseguido de várias formas, com benefícios (creches, ginásio, fruta, massagens, etc.), ou com práticas que sejam valorizadas pelos trabalhadores (flexibilidade de horário, autonomia, trabalho em equipa, etc.).
Como relativamente a tudo, a ciência económica tem formas cínicas de olhar para esta realidade. Uma dessas formas é o que se chama de teoria dos diferenciais salariais compensatórios. Segundo esta teoria, em equilíbrio, todos os empregos “pagam” a mesma utilidade aos trabalhadores. Se há empregos que pagam salários mais elevados, esse diferencial salarial é uma compensação para condições de trabalho mais penalizadoras (pior horário, menor salubridade, trabalho menos interessante, etc.). Um exemplo da aplicação desta teoria seria uma empresa pagar salários mais elevados do que outra que oferecia ar condicionado no escritório. Em equilíbrio, o custo da instalação do ar condicionado seria igual à diferença de custos com salários entre uma empresa e outra. E essa diferença de salário tornaria indiferente para os trabalhadores a opção entre uma empresa e outra.
Voltando à felicidade, podemos ver a mesma situação. Haverá pessoas que preferem ganhar um salário inferior, mas ter alguns desses benefícios, aos quais atribuirão maior utilidade. Em equilíbrio, a oferta de felicidade pelas organizações será igual à procura de felicidade pelos trabalhadores. Até se atingir essa quimera do equilíbrio, há aqui um grande espaço para organizações e pessoas realizarem operações de arbitragem. Ou seja, se os trabalhadores valorizam mais as práticas de felicidade (através dos salários mais baixos que aceitam para trabalhar nessas condições) do que esse investimento na felicidade custa à empresa, as empresas têm a ganhar em investir na felicidade organizacional.
Se isto vos parece demasiado cinismo, e preferem acreditar que as organizações investem em felicidade por genuína preocupação com os seus trabalhadores, vamos recordar o que se passou há alguns anos em Portugal com a certificação em qualidade. Na altura, todas as empresas se diziam genuinamente interessadas na melhoria constante e na promoção da qualidade. O que aconteceu quando a certificação se banalizou e deixou de ser uma vantagem competitiva? As empresas deixaram de renovar as certificações e grande maioria abandonou essas práticas…
Claro que também há empresas que se preocupam genuinamente com a felicidade dos seus trabalhadores e que tomam este tipo de iniciativas porque acreditam que devem contribuir para a sua felicidade. Mas deverá isso preocupar-nos? Faz diferença se a nossa empresa investe na nossa felicidade por interesse ou de forma desinteressada? Ou o importante é que esse investimento seja realizado?