A gestão das empresas já não é uma tarefa para amadores. Recordo que há alguns anos era comum termos na liderança máxima das empresas, profissionais com qualificações diversas (talvez mais notavelmente nas engenharias). Isto talvez mais marcadamente em empresas de média e grande dimensão, porque nas mais pequenas a ausência de qualificações escolares, ou académicas, mantém-se com desesperante resiliência. Mas, este “padrão” tem vindo a mudar. E muda porque entendemos que hoje, a gestão combina ciência (ou conhecimento), com arte (na subtileza de saber identificar e gerir as idiossincrasias que distinguem os indivíduos), e com o que comummente designamos por intuição.
Conhecimento, arte e intuição são pilares cruciais para o bom desempenho das empresas. O conhecimento em gestão é atualmente reconhecido. Os estudantes aprendem inúmeros modelos, técnicas e taxonomias que podem (e devem) utilizar nas suas atividades profissionais. Da gestão de operações, aos recursos humanos, aos conceitos de marketing, à contabilidade e finanças, é impressionante como são expostos aos jovens estudantes do melhor que se conhece e compreende no mundo. Modelos de análise, de maximização de resultados, de redução de riscos, de otimização de caminhos, de aproveitamento dos recursos escassos para obter o melhor rendimento de cada recurso utilizado, de técnicas de seleção do capital humano, as disciplinas num curso de gestão, no mínimo, começam a preparar os futuros profissionais para serem melhores profissionais. Há uma preocupação especial em todo este ensino e toda a aprendizagem: os jovens são os geradores de riqueza no futuro!
Como a minha área é estratégia e negócios internacionais, pelo menos maioritariamente, preciso reconhecer dois aspetos. Primeiro, todas as empresas precisam ter uma estratégia. Uma estratégia que oriente as ações, os investimentos, as contratações, as decisões de expansão ou de não expansão. A estratégia dá o rumo ao colocar o objetivo no horizonte. Sem este rumo, as empresas deambulam e os gestores ficam presos a gerir o presente, os afazeres do dia-a-dia sem realmente saberem para onde estão a ir. Quando o presente toma conta, não há futuro. Segundo, certamente já todos reconhecemos que o mercado nacional é ótimo mas é pequeno. Temos um lindo país mas precisamos ir buscar outros clientes ao estrangeiro. A internacionalização é um imperativo. Mas, sendo imperativa, a internacionalização precisa ser orientada por uma estratégia clara e não por meros aproveitamentos de fundos estruturais ou de vontades espúrias.
A gestão tem muito de arte. A tentação é referir a arte de escolher e gerir pessoas. As pessoas são fundamentais, como todos ouvimos. Aliás, todos sabemos que não há empresas sem pessoas e que uma empresa com trabalhadores fracos não pode ser mais que uma empresa fraca. Curiosamente, ou talvez nem tanto, a preocupação parece estar em praticar salários baixos (em total desprezo a conceitos e dinâmicas bem conhecidas de qualquer estudante de gestão – como sejam os de motivação, para ficar ao nível mais básico), aumentar a precariedade ou em despedir ao primeiro sinal de abrandamento da atividade. O recurso mais valioso (as pessoas) passa rapidamente a ser o recurso mais descartável. Sem surpresa a produtividade só não baixa mais pela ética profissional dos trabalhadores portugueses.
Mas, a arte não se prende apenas com as pessoas que compõem a organização. É mais ampla e geral. É relacional em alguma medida, porque um gestor precisa estar em constante interação com clientes, fornecedores, parceiros comerciais, outras empresas concorrentes, com agentes públicos, em Portugal e no estrangeiro. O gestor que não circula, o técnico tem um horizonte do mundo do tamanho do seu gabinete. É o gestor dos 12. Os 12 metros quadrados do seu gabinete. É o técnico e este é realmente o mais descartável dos trabalhadores.
E a gestão é, ainda, arte na medida que tem uma componente imaterial crucial: o entendimento do mundo e das pessoas. Qualquer, e todos, alunos de gestão aprendem na segunda aula de Introdução à gestão que as empresas são sistemas abertos. Recebem inputs (matérias, trabalho, energia, etc.) e colocam o seu produto no mercado. Na cadeia interna geram valor de modo que os custos dos insumos sejam inferiores aos custos do produto final. Mas, há uma componente crucial que é o entendimento do mundo, que afeta tanto o recebimento dos insumos como a colocação dos produtos. O entendimento deste mundo exterior determina o desempenho. A história empresarial tem inúmeras empresas que desapareceram, incapazes de perceber o mundo.
A terceira componente da gestão descrevi como intuição. Mas, reformulo como o conhecimento alargado de tudo. A intuição na gestão de uma empresa exige um conhecimento profundo (agora não das técnicas aprendidas na escola) do que se passa a nível económico, político, tecnológico, social, cultural, demográfico, etc., entendendo quais as implicações para o setor e a empresa especificamente. A intuição em gestão é pouco mais do que uma perspicácia excelentemente informada. Talvez por isso tenho defendido que os gestores deviam ser obrigados a estudar continuamente. A fazer formações. A voltar à escola. É fácil perder a intuição quando o nosso dia-a-dia é tapar buracos e apagar fogos. Gerir o presente não ajuda a construir o futuro.
Importa, ainda, entender que estratégia não é eficiência. Todas as empresas, independentemente da estratégia que sigam, precisam ter uma preocupação com eficiência. Estratégia também não é diferenciar dos concorrentes. A diferenciação é uma alternativa estratégica, mas uma diferenciação de pormenor. Em primeira instância as empresas precisam ser legítimas, cumprir as suas naturezas, o que exige ser substancialmente igual às restantes empresas – igual às empresas concorrentes. A igualdade, e não a diferença, é o que carateriza o tecido económico.
Em última análise, e em tempos de crise, o bom desempenho das empresas pode significar simplesmente o conseguir sobreviver, e mesmo para isso é preciso conhecimento, arte e intuição. Sabemos agora que é o conhecimento das técnicas que são aprendidas na escola nos cursos de gestão; arte na gestão das pessoas que são um ativo valioso, e no entendimento do mundo; e intuição, que pouco mais significa que um profundo conhecimento e atenção ao que se passa ao redor para identificar tendências, antecipar mudanças e atuar proativamente. Recordo a expressão de um amigo académico “Quando os tempos apertam, os neurónios acendem”.